Ler angústias nossas na folha de um livro escrito por outro punho é um dos meus mais requintados prazeres. É um aconchego que se senta ao nosso lado sem paternalismo e nos diz: eu sei. Não aquela festa na cabeça e um been there, done that que não deixa de dar um tom de desprezo pela nossa majestática dor, é um olhos nos olhos, um discreto, um mexer de lábios quase sem som: eu sei. Se há uma coisa para a qual deixei de ter paciência, com a mesma convicção com que se abandona um vício, é para seres que se acochilam no nosso ombro ou oferecem o seu já usado, para desabafar tristezas. Como se isso resolvesse alguma coisa. Se eu tiver uma bola de ténis entalada a meio do esófago durante semanas tossir um bocadinho não ma vai tirar de lá. É necessário uma esofagotomia com sangue e entranhas ao ar para começar a resolver o problema. E isso faz-se em local privado e reservado, é só precisar o local da incisão.
2 comentários:
gosto tanto do que escreves.
é preciso sangue. não sai a seco.
Há livros como bisturis, que expõem o nosso coração em palavras, fazendo-nos pensar "como é possível?", como se a mão que o escreveu tivesse a mesma vivência, o mesmo sentir ...
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